por Sulamita Esteliam
Meu amigo Rogério Tomaz Jr, do Conexão Brasília Maranhão – e fotógrafo dos bons -, me manda “a imagem do dia”, de ontem, postada a propósito da aprovação da Comissão da Verdade pela Câmara dos Deputados; reproduzo.
Aconteceu no final da noite do dia 21, por votação simbólica – e o projeto segue para o Senado. A comissão é composta por sete pessoas e vai investigar a violação de direitos humanos desde setembro de 1946 até outubro de 1988, quando foi promulgada nossa Constituição. Demorou.
Para garantir a votação, em regime de urgência-urgentíssima, o governo teve que ceder alguns pontos, à direita. O que gera críticas à esquerda e entre as famílias de mortos e desaparecidos durante a ditadura 1964-1985 – aqui no Portal Terra.
O projeto original, em si, é criticado, por seu caráter conciliatório, sem punição aos torturadores e responsáveis pelo arbítrio e terror que se instalaram no país durante 21 anos – clique para ler em Carta Maior. Também pelo que seria pressa do governo em aprová-lo, sem discussão mais ampla na sociedade. Isso, convenhamos, é uma injustiça.
Há quase duas décadas este assunto se arrasta, governo após governo, comissão após comissão, plano após plano de direitos humanos. Agora saiu, melhor assim do que de jeito nenhum. Um passo à frente é avanço.
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Nesse ponto, concordo plenamente com Nilmário Miranda, ex-secretário Nacional de Direitos Humanos e um paladino do direito à memória e à verdade, a quem tive a honra de assessorar no início dos anos 90. Na semana passada, ele e outros ex-ministros da área acompanharam a secretária Nacional dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, a um périplo-pressão no Congresso pela Comissão da Verdade – aqui, neste blogue.
Ex-preso político e torturado, que pertenceu à mesma organização da presidenta Dilma Roussef, a Polop, Nilmário criou, em 1991, a Comissão de Desaparecidos Políticos da Câmara dos Deputados. Abriu-se, aí, a “Caixa de Pandora” sobre a repressão do governo militar. Foi quando se começou, a desvendar o destino dos “desaparecidos políticos” e a esperança de que um dia a verdade seria disseminada.
Acompanhei este início de processo de perto, e o relato em meu livro Estação Ferrugem, editado pela Vozes, 1988, em parceria com a Prefeitura de Belo Horizonte. Conta a história da região operária de Belo Horizonte-Contagem, resgata o movimento sindical dos anos 50-90 e a resistência à ditadura na ótica dos trabalhadores.
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Transcrevo, reunidos num só bloco, o que o ex-deputado, ex-ministro e atual presidente da Fundação Perseu Abramo escreve a respeito em três postagens, no Blog do Nilmário, hoje:
In vino veritas
Comemorei a aprovação da Comissão Nacional da Verdade tomando vinho com Carlos Tibúrcio em seu apartamento. A mídia fez cobertura discreta da histórica votação, talvez pela hora que ocorreu, depois das 23 horas. Vinho e verdade estão associados na história.
Comissão Nacional da Verdade
A Câmara aprovou a Comissão Nacional da Verdade em reunião tensa e com um acordo obtido aos 47 minutos do segundo tempo. A meu juízo o acordo não alterou a essência da CNV. Não poderão ser indicados dirigentes partidários, pessoas que detenham cargos comissionados ou que não tenham condições de atuar com imparcialidade. Parece-me óbvio que a própria presidenta usaria estes critérios.
O importante é que foi aprovada a Comissão Nacional da Verdade, com sete pessoas éticas, íntegras e comprometidas com os direitos humanos e que passarão à limpo as violações na ditadura e produzirão um relatório ao cabo de dois anos.
A CNV terá o poder de convocar pessoas e de requisitar documentos em qualquer grau de sigilo. Agora o projeto irá para o Senado.
CNV: eu estive lá
Como ex-deputado pude acompanhar dentro do plenário desde as 13 horas até o final, depois das 23 horas. Minha presença foi saudada na tribuna por vários deputados como Amauri Teixeira (no exercício da presidência), Luiza Erundina, Janete Pietá, Emiliano José, Domingos Dutra, Assis Couto. E fora da tribuna por dezenas de deputados de todos os partidos.
Mas minha presença provocou a ira descontrolada do deputado Jair Bolsonaro que, em todas as intervenções, dirigiu-se a mim de forma provocativa e até truculenta, mas não é levado a sério.
De algum modo pude contribuir, dialogando com deputados do PSOL, com Luiza Erundina e deputados do PT com críticas de boa fé e com deputados confusos quanto ao projeto da CNV.
O projeto despertou também o reacionarismo, o quanto para alguns a democracia é palavra vazia. Mas somente 42 votaram contra a urgência, querendo postergar a votação. Foram 351 votos que permitiram a aprovação na mesma histórica noite de 21 de setembro, dia do começo da primavera.
CNV: artistas e intelectuais aprovaram
Nada menos que 300 artistas e intelectuais assinaram um manifesto pela Comissão Nacional da Verdade, articulado por Emir Sader, Fernando Morais, Boff e outros. Encabeçaram Chico Buarque, Caetano, Gil, Galeano, Marilena Chauí, Noam Chomsky, Marieta Severo, Letícia Sabatella, Edu Lobo, Ivan Lins, João Bosco, Paulo Betti, Alceu Valença, Silvio Tendler, Daniela Mercury, Francis Hime, só pessoas do bem, da música, TV, teatro, literatura, imprensa, academia.
Poderia ter outras 300 ou mais, pois é uma causa da democracia, do projeto de nação.
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